O sistema de saúde no Brasil enfrenta um cenário crescente e preocupante de aumento dos custos. Este aspecto é objeto frequente de discussão, pois é grande a insatisfação de praticamente todos que atuam neste mercado. É claro que uma série de fatores contribui para a construção deste cenário, no entanto, o modelo de remuneração adotado em todo o sistema é um dos principais agravantes, sobretudo, porque privilegia a quantidade sem considerar a qualidade e os resultados dos serviços prestados. Um prestador de serviços recebe do plano de saúde, por exemplo, pela quantidade de procedimentos realizados (consultas, cirurgias, entre outros) baseado em tabelas padronizadas independente do resultado gerado. E, em nenhum momento, salvo pequenas iniciativas, o pagamento é alterado em decorrência dos resultados destes procedimentos.
É evidente que é preciso transformar o cenário e promover uma revisão e uma reestruturação deste formato. Enquanto esta discussão e busca por alternativas ocorre de maneira lenta e gradual, devido à sua complexidade, há, porém outro caminho que deve ser considerado prioritário para que os resultados sejam atingidos de maneira mais rápida, fazendo frente ao crescimento exponencial dos custos. Este caminho é a adoção de novas tecnologias capazes de revolucionar os serviços de saúde. Neste contexto, destacam-se os conceitos de telemedicina, e-Health e m-Health.
A Organização Mundial da Saúde define e-Health como o uso das tecnologias de informação e comunicação (ICT) na saúde. Em uma definição mais ampla, e-Health consiste em melhorar o fluxo de informação, através de meios eletrônicos e, com isso, aprimorar a prestação de serviços e a coordenação dos sistemas de saúde. Já o m-Health, que está inserido dentro de todo este conceito mais amplo, permite a colaboração por meio de aplicações disponíveis nos dispositivos móveis. O que é mais importante é que esses recursos não só ampliam a assistência facilitando o acesso dos pacientes aos médicos e provedores de saúde, mas diminuem os custos operacionais e evitam desperdício de recursos.
Embora este seja o caminho mais simples e rentável, o Brasil encontra-se bastante atrasado na adoção destas tecnologias, que, na verdade, já estão disponíveis há algum tempo. Seja por opção de uso e custos, desconhecimento ou mesmo por falta de acesso, muitas vezes os pacientes acabam procurando os serviços de maior complexidade, como as emergências e unidades de pronto atendimento, quando poderiam resolver boa parte dos problemas à distância. Teoricamente, já existe uma mudança de atitude dos consumidores. Segundo uma pesquisa divulgada pela empresa de tecnologia Cisco, 84% dos entrevistados disseram estar mais preocupados com a qualidade da assistência médica do que com o contato pessoal. O estudo também revelou que 76% dos usuários do sistema brasileiro de saúde dizem estar abertos ao atendimento médico virtual. No entanto, não obstante algumas iniciativas isoladas, ainda atravessamos a fase de quebrar barreiras no que diz respeito à aceitação e até boa vontade das autarquias e entidades de classe reguladoras para que estas inovações sejam implementadas.
Sendo assim, é mais do que preciso mudar o foco da proibição para a regulação. Os resultados seriam muito mais positivos se alguns paradigmas fossem deixados de lado. Estudos realizados em todo mundo apontam o m-Health,mais especificamente os apps, como ferramentas ideais para reduzir os custos em saúde. Na Europa, por exemplo, existe uma pesquisa que demonstra os impactos socioeconômicos da adoção do m-Health. Segundo a GSMA – Global Strategic Marketing Alliance, instituição responsável por compilar estes dados, esta tecnologia deve reduzir os gastos anuais totais com assistência à saúde em quase 100 bilhões de euros em 2017. Ou seja, o m-Health pode melhorar o estilo de vida, permitir o tratamento remoto de problemas de saúde, equipar os provedores de saúde para a tomada de melhores decisões clínicas e ainda tornar o sistema de saúde mais sustentável.
Os serviços de orientação e informação em saúde por telefone no Brasil já são exemplos de que as iniciativas de atendimento à distância podem ser bem sucedidas. Demonstram que é possível ter um atendimento de qualidade mesmo sem a presença física de um médico ou enfermeiro. O atendimento neste caso é realizado por profissionais de enfermagem e o diferencial do serviço está no fato do atendimento ser baseado em um software de algoritmos de triagem clínica, proporcionando cuidados mais assertivos, registrando perguntas e respostas e criando um histórico de todo o atendimento. De acordo com estatísticas realizadas pela TopMed junto a usuários desse tipo de serviço, foi possível reduzir em 59% as idas desnecessárias aos prontos atendimentos, aumentar em 50% o índice de autocuidado em casa e diminuir em 80% a incidência de automedicação. Imagine então se tecnologias mais avançadas, de monitoramento de saúde à distância, e atendimentos via videoconferência pudessem ser realizados em escala?
Portanto, neste momento, os esforços devem ser voltados para garantir que estas inovações tenham o mínimo de segurança e respeito aos preceitos básicos do atendimento em saúde. É preciso mais do que nunca enxergar a telemedicina como uma das saídas para alcançarmos um sistema de saúde que seja sustentável e ao mesmo tempo de qualidade e eficiência nos cuidados dos pacientes. Afinal, a tecnologia existe, a eficiência é comprovada e os usuários aprovam.
*Paulo Salvi é diretor superintendente da TopMed.