La Casa de Papel tornou-se a série de língua não inglesa mais assistida da Netflix e a música tema Bella Ciao virou um sucesso absoluto. Silvio César Rangel Gama da Silva, vendedor de balas ambulante, mais conhecido como “Cesinha do Xicrete”, aproveitou a popularidade da série para criar uma paródia da música e aumentar suas vendas. A ideia era atrair mais clientes nas ruas de um modo interativo e divertido. Nem preciso dizer que deu certo, né?
Podemos considerar que Cesinha foi empreendedor? Na verdade, o que é empreender? Ipsis litteris ao dicionário: empreender é pôr em execução, fazer ou realizar.
Bem, essa definição não cita nada relacionado a startups ou tecnologia, mas muitas pessoas acreditam que todo empreendedor tem uma startup, e vice e versa. Errado! Steve Blank – acadêmico que estuda o empreendedorismo – explica que uma startup é: “uma organização temporária em busca do modelo de negócios repetível e escalável”, e que é apenas um dos modos de empreender.
Ou seja, precisamos dissociar o empreendedorismo do fato de ter ou criar uma empresa. A literatura já aponta que atualmente existem alguns tipos de empreendedor, como o corporativo, o social e o de startup…Sendo assim, um empreendedor pode estar tanto no ambiente externo como nos ambientes internos das corporações. Para mim, um empreendedor essencialmente deve identificar oportunidades e agir sobre elas com todas as suas forças e crenças.
Falando em oportunidade, uma característica importante no perfil empreendedor é a identificação do timing correto. A expressão time is money deve ser analisada não só pelo seu ponto de vista tradicional, de que tempo é dinheiro, mas também pelo viés de como o momento ideal das coisas acontecerem interfere em quanto dinheiro você vai ganhar.
Bill Gross, fundador da Idealab, em seu TED Talk, diz que o momento de lançamento e execução de uma ideia pode definir em até 42% seu sucesso ou fracasso. Ele indica que devemos nos questionar se “a ideia é muito avançada e o mundo não está preparado para isso? Ou é tarde demais e já existem muitos concorrentes?”.
O caso do Virtual Boy, exemplifica bem esta questão. Este console da Nintendo foi lançado em 1995, com uns óculos apoiados em um tripé para simular realidade virtual. O aparelho obteve pouquíssima aceitação no mercado. Se fosse lançado hoje, será que o Virtual Boy seria um sucesso de vendas?
Não citei nada relacionado a tecnologia até o momento e o fiz de propósito. Sendo engenheira eletrônica e trabalhando há algum tempo com tecnologia e inovação na IBM, seria o plausível e esperado de minha parte ter citado a tecnologia como um ponto essencial na definição de sucesso de um empreendedor, não? Bom, acredito que a tecnologia não é o fim, mas sim o meio para alcançar objetivos e alavancar modelos de negócio, atingindo escalas inimagináveis, além de facilitar processos de trabalho em segmentos diversos.
Advogados, médicos e engenheiros, entre outros, se beneficiam da democratização da tecnologia através da nuvem. Soluções inteligentes empoderam os seres humanos ao automatizar tarefas rotineiras e utilizar, por exemplo, inteligência artificial; ou ao controlar cadeias produtivas com blockchain, e até mesmo ao gerar relatórios de maquinários através da Internet das Coisas.
O importante é analisar que em todos os exemplos que citei, o empreendimento não está na tecnologia em si, mas em como ela é ferramenta fundamental para viabilizar uma ideia.
Voltando ao Cesinha, após colocar a gravação da paródia no YouTube, ele obteve mais de 2,5 milhões de visualizações e foi chamado pela Halls para gravar a música com um cantor de funk profissional. Perceba que Cesinha foi empreendedor por ter pensado um jeito diferente de vender; e o seu sucesso foi alcançado através da combinação da fama da série com a escalabilidade gerada pelo Youtube.
*Stéfany Mazon é especialista em inteligência artificial e programação na IBM Brasil