“Meu nome é Huggy Wuggy
Dentes afiados te deixam ensanguentada
Nunca me chame de feio
Me abrace até morrer
Eu sei onde você está se escondendo
Você está deslizando pela tubulação
Você não sabe que eu vou te encontrar?
Aonde quer que você vá
No escuro estou esperando
Não tem escapatória
Você não sabe que estou bem atrás de você?
Mais perto do que você imagina”
Parece música de filme de terror e, de certa maneira, é. Mas o mais impressionante é que a canção tema do Huggy Wuggy, que é personagem de um game para adultos, voltado para o público de 14 anos para cima, tem feito sucesso entre crianças pequenas, por volta dos 6 anos. Às vezes, até menos. Nem todas entendem, mas acabam sendo impactadas pelo videoclipe, que circula pelas redes sociais e streamings abertos.
O game Poppy Playtime, que tem o Huggy Wuggy como personagem, conta a história de brinquedos abandonados e esquecidos em uma fábrica vazia, com cenário aterrorizante. O jogador precisa passar pelos corredores sem ser atacado e morto pela pelúcia azul, com uma boca enorme, cheia de dentes afiados.
Não é para o público infantil, mas, com a internet e a facilidade que ela oferece para que qualquer tipo de conteúdo chegue a qualquer tipo de pessoa, é preciso ficar atento. Além de assustar e ser violento, o conteúdo pode gerar medo, angústia, ansiedade, traumas, atrapalhar o sono…
Os riscos na web
Mas o Huggy Wuggy é apenas o personagem da moda. Existem outros perigos na internet. Além dos vídeos, músicas e games com conteúdo impróprio, há desafios que podem ser perigosos para a saúde física e mental. Um deles é o desafio blecaute ou “apagão”, que consiste em se sufocar até desmaiar e perder a consciência, e já fez algumas crianças e adolescentes perderem a vida pelo mundo. “Lendas, pessoas mal intencionadas e conteúdos inúteis sempre existiram e, infelizmente, vão continuar existindo. Os meios digitais apenas potencializam os danos e encontram caminho de acesso para alcançar com maior facilidade os mais vulneráveis”, explica a advogada e especialista em Direito Digital Alessandra Borelli, autora do livro Crianças e Adolescentes no Mundo Digital: Orientações Essenciais Para o Uso Seguro e Consciente das Novas Tecnologias (Editora Autêntica).
“Apesar de as crianças, hoje, serem muito habilidosas com os aparatos tecnológicos, não podemos ignorar o fato de que, fisiologicamente, elas continuam sendo seres em condição peculiar de desenvolvimento e, portanto, desprovidas de discernimento e maturidade suficientes para lidar com certos conteúdos”, lembra Alessandra. “Ficam inseguras e isso pode gerar uma série de impactos e prejuízos no desenvolvimento”, indica.
Talvez seu filho ainda seja muito pequeno para acessar ou até se interessar por esse tipo de conteúdo mas, quanto antes você se preparar para lidar com o assunto, ficar de olho e, principalmente, se preparar para essa conversa, maior a chance de criar um espaço de diálogo e de ajudar o pequeno a navegar com segurança – e supervisão – pela internet. Para a psicóloga e terapeuta de família Cristiane Lima (RJ), essa discussão deve começar, independentemente da idade, a partir do momento em que a criança pega o celular ou o tablet para assistir a conteúdos ou brincar com joguinhos. “A criança começou a pegar o celular para jogar, a ter um espaço para exercer essa escolha de jogos e de redes sociais, o diálogo deve começar a acontecer. Desde que a criança tenha acesso, precisa conversar”, explica.
Acesso controlado
Não há como evitar e você nem deveria mesmo fazer isso, já que as crianças desta geração são impactadas o tempo todo pela tecnologia. E há muitos lados positivos nisso também! Poder acessar várias informações e conteúdos, de qualquer parte do mundo, fazer pesquisas, assistir ao que você quiser, a qualquer hora, conversar com pessoas queridas que estão distantes fisicamente… O que seria do mundo durante aquela fase de mais isolamento da pandemia, quando as crianças não podiam se encontrar com os avós? Já imaginou?
Mais importante do que proibir, é ajudar seu filho a navegar, de acordo com a idade, é claro, mas com limites e, principalmente, segurança. Será que dá para fazer isso? Fácil, não é, mas é possível – e imprescindível.
Limite de tempo e regras
O primeiro ponto é não deixar essa navegação livre. “Prevenção é sempre o melhor caminho”, ensina Alessandra. “É fundamental o contínuo acompanhamento de crianças e adolescentes no universo digital, observando o que eles acessam, com quem interagem, quem são seus ‘ídolos’ (influenciadores digitais) e como essas crianças se portam durante e após o uso dos eletrônicos”, complementa.
Além disso, faça combinados possíveis e saudáveis, determinando tempo e momentos nos quais a criança pode utilizar a internet para jogar e assistir a conteúdos. “Ansiedade, transtorno de sono, tudo o que seu filho apresenta diante de um conteúdo inadequado ou de um game é consequência do tempo de estímulo que é permitido a ele”, lembra Cristiane. O tempo de exposição deve ser determinado de acordo com a idade da criança. De acordo com as recomendações da Sociedade Brasileira de Pediatria, crianças menores de 2 anos não deveriam ser expostas a telas e, para as maiores, entre 2 e 5 anos, o tempo deve ser limitado a uma hora por dia.
Você é o exemplo
Um ponto importante! Não adianta orientar a criança a não usar as telas ou limitar o tempo de uso, se você mesmo não dá o exemplo. O seu comportamento ensina muito mais às crianças sobre como agir do que suas palavras. “Às vezes, estamos tão cansados que é mais fácil deixar nossos filhos jogando ou assistindo TV ou vídeos na internet para que possamos ter um momento nosso, nas nossas redes sociais, inclusive, em vez de ficar atento ao que realmente precisa ser visto”, lembra Cristiane. A recomendação de ter cautela no consumo da internet vale para os adultos também, viu?
Espaço de segurança e muito diálogo
Conversar com seu filho, desde sempre, sobre todos os assuntos, e garantir que ele tenha sempre um canal aberto e seguro para contar o que está sentindo são as melhores formas de prevenir danos causados por conteúdos inadequados. “A melhor forma de preparar nossos filhos é criar um ambiente de segurança para que eles consigam se expressar. Quando eles não conseguem falar para os adultos de confiança o que estão sentindo, o que os tocou, quais as dificuldades, aí, sim, vão chegar aos sintomas [como ansiedade, medos e traumas, entre outros] porque não tiveram espaço para falar”, explica a psicóloga.
Caso a criança já tenha se deparado com algum conteúdo e ficado com medo, é interessante ouvi-la, antes de falar. É preciso oferecer escuta para entender as emoções e aí, sim, tentar desconstruir as crenças do medo e, aos poucos, dessensibilizar. “Quando as crianças acessam algo que aciona o medo ou alguma sensação ruim, se não há diálogo ou espaço seguro, elas passam a ter dois medos: o medo da situação, em si, e o medo de contar para os pais o que está acontecendo e aí eles os proibirem de assistir ou de jogar”, reflete Cristiane.
8 dicas importantes para proteger seu filho dos perigos da internet
- Mantenha-se informado e fique atento para não tornar o assunto ainda mais “aterrorizante”.
- No caso de crianças pequenas, opte por utilizar plataformas de streaming fechadas, como Netflix e PlayKids.
- Levando em consideração as preferências dos seus filhos, selecione previamente os conteúdos acessíveis, atualizando-os sempre que necessário.
- Jamais acredite que você (ou seus filhos) não estão sujeitos aos perigos da internet. O excesso de confiança representa um dos maiores fatores de risco.
- Nada de deixar a criança ficar com a porta do quarto fechada, abduzida pelas telas (celular, tablet, computador ….).
- Ensine ao seu filho que senhas e informações pessoais não devem ser compartilhadas com ninguém, além dos pais ou responsáveis.
- Procure sempre saber sobre o que atrai sua criança neste universo digital e os motivos, como funciona, o que propõe o jogo ou aplicativo, se é indicado para a idade, se propicia interação com estranho, etc.
- Por fim, estabeleça um virtuoso canal de comunicação offline.